XVIII.
A morte da esposa antes do Jorge Gabriel
O Alves soube da morte da esposa pelos noticiários televisivos. Foi mesmo quando estava prestes a mudar o canal para ouvir os comentários do Jorge Gabriel que a voz da locutora lhe prendeu a atenção ao falar num triplo assassinato em Lisboa. A verdade é que as mortes de Juliana e de Sandra (bem analisada a história, apenas porque falavam e falaram demais) apenas tiveram eco porque a elas se sucedeu, cronologicamente, a morte do homem de fato cinzento. Sim, porque a morte de um homem que veste fato cinzento, que se faz deslocar num BMW série 7, tem lugar reservado na garagem, pisca o olho às secretárias, passa horas na Internet a jogar póquer e ver miúdas, conversa sobre bola entre amena cavaqueira futebolística ao fim da tarde, e, sobretudo, é um empresário bem sucedido numa nova área de negócios tão prometedora como a da venda de Silêncio, é claro que essa morte é sempre mais relevante do que morte, ainda que tão brutal, de meros funcionários anónimos do sistema. No caso concreto, e como as três mortes estavam relacionadas, pelo menos assim logo a Polícia o deduziu, verificando o calibre das munições utilizadas, quer o homem de fato cinzento, quer Juliana e Sandra, tiveram direito aos seus famosos quinze minutos de estrelato televisivo – pena é que não estivessem vivos para assistir... «Foda-se!», disse o Alves. E sorriu com a sorte que tivera! «E não é que foi outro cabrão qualquer a sujar as mãos, poupando-me ao trabalho!», comentou, logo, logo carregando no botão do comendo televisivo a ver se ainda apanhava os comentários do Gabriel. Alves estava feliz, mesmo que desconhecendo que enviuvava cornudo, mesmo ignorando o balúrdio que iria ter de gastar com o enterro da Juliana.
Cenas da próxima gota:
Sem comentários:
Enviar um comentário