segunda-feira, 18 de junho de 2007

O Fantasma

mexia tem poesia nova
em livro dito senhor fantasma. ora
fantasma era como me chamavam
quando adolescente rapaz então
mais voltado para a paródia
do que para a prosódia
e me escapava pela varanda do meu quarto
em portimão para ir fazer
pequenas patifarias pelas ruas
dos três bicos. assim mesmo chapéu
aos clássicos tanto mais que na altura
em matéria de literatura
gostava era de banda desenhada
quando muito o mandarim o strogoff
embora fosse mais de coboiada
ou se quiserem romance de cavalaria.
companheiros de noitada
o tomás o becas o miguel o luís
o ernesto o sandro o rui
e também certa vez recordo um cão
chamado dodge que caiu numa cisterna
logo depois em grande aventura resgatado.
era no tempo das fisgas do berlinde
dos canudos e das suérfias
palavra que confesso nem sei
se existe ao contrário da certeza
da loucura das lutas combinadas
do suco transparente e ácido das amêndoas
e dos albricoques ainda verdes
ou do sabor amargo das alfarrobas
no intervalo dos jogos de futebol
onde hoje passa uma estrada
que vai dar a uma rotunda
ou não andasse o país inteiro
a transformar-se numa rotunda gigante.
e eis como de forma algo fantasmagórica
mexia que é doutros campeonatos
acabou por entrar nas memórias
da minha adolescência algures por entre
sol e figueiras por entre o mar
e as amendoeiras pelo calor das noites perfeitas
não fosse terem-se desfeito
em gratas recordações. hoje bem que me apetecia
subir a uma a uma só dessas árvores
que havia no barranco e que o tempo plantou
no terreno fértil destes versos. hoje
é curioso a varanda do meu quarto
tomou a forma das palavras
e eu que já não sou o fantasma
porque todos aqueles que por mim esperavam
na rua se esfumaram como sombras
nos meus dias eu agora
dava tudo para poder saltar de novo
para dentro daquelas noites claras
em que ríamos e fazíamos
planos de futuro até à madrugada.

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